Oi.
Essa aqui é minha newsletter de recomendações. Toda semana, indico um filme e um disco que eu amo, entre hits e títulos menos conhecidos, para você de repente dar uma chance.
Caso você goste dessa newsletter e quiser compartilhá-la nas suas redes, agradeço! Até porque eu mesmo sou meio ruim de divulgar minhas coisas. Eu até faço uma postagem ou outra nos meus stories, mas dá um pouco de vergonha ficar se autopromovendo e chamando a atenção das pessoas desse jeito. Fico me sentindo que nem aquele meme da formiga segurando uma trouxa, sabe?
Enfim, aí vão as dicas de hoje!
Música
Luis Miguel - Aries (1993)
Na minha vida profissional e pessoal, eu sempre fui meio contra o conceito de “público alvo". Claro que, olhando em retrospecto, eu até consigo entender como uma obra tipo Crepúsculo mexe mais com garotas adolescentes do subúrbio americano do que com estivadores filipinos com mais de 50 anos de idade. Contudo, se eu nunca tivesse ouvido falar no livro e alguém chegasse pra mim perguntando: “cara, você quer ir comigo ver um filme sobre uma moça que vive um triângulo amoroso entre um vampiro e um lobisomen?", eu certamente ia responder: “parece irado, bora!”. Tenho certeza que até mesmo um estivador filipino poderia ficar mexido com o convite. Mó premissa legal. Se eu ia gostar ou não do filme é uma questão que eu não sei responder, porque eu nunca vi Crepúsculo. Mas imagino que isso teria mais a ver com a qualidade dele do que com meu gênero, orientação sexual e/ou faixa etária.
Como roteirista de televisão, eu sempre ouço o termo “público alvo” sendo jogado pra lá e pra cá em reuniões e posso dizer com bastante propriedade que, na grande maioria das vezes, ninguém sabe bulhufas do que está falando. Sério, eu já ouvi o pessoal proferir os maiores impropérios em relação a isso. Tipo aquela vez que um produtor me disse: “nenhum adolescente vai ver essa série se não tive skate. Adolescente só pensa em uma coisa: skate!". E teve também o dia que um executivo de um canal leu um roteiro que eu estava desenvolvendo com uma colega e comentou: “Essa cena envolvendo uma piada com diarreia é engraçada, mas tem que cair. Nosso projeto foi feito para mulheres entre 20 e 30 anos. Elas não gostam desse tipo de humor" - no que minha colega, uma mulher que na época tinha entre 20 e 30 anos, respondeu: “mas fui eu que escrevi essa piada. Eu gosto dela!". A piada era boa mesmo, mas no final a gente teve que tirá-la, o que me faz pensar que essa coisa de público alvo não é algo tão real quanto gostaríamos de acreditar, mas uma parada que é imposta sobre a gente. Fica decidido que mulheres jovens não riem com piada de cocô e a gente enquanto sociedade aceita. Triste. Todo mundo merece uma boa piada de cocô.
Quando eu era criança, o primeiro disco que eu aprendi a amar foi Private Dancer, da Tina Turner. Meus pais, na época, tinham uma vitrola em casa mas não costumavam ouvir muita música, de modo que a coleção de LPs deles era bem pequena e aleatória, com discos que eles ganharam ou então compraram porque estava na moda. Eu comecei a ouvir Private Dancer por nenhum motivo especial, apenas porque ele estava lá, com um gatinho preto na capa que me chamou a atenção. Eu acho que meus pais até chegaram a comprar uns álbuns mais voltados ao meu público alvo, alguma coisa da Xuxa ou da Mara Maravilha talvez, mas, no final, foi na Tina mesmo que eu pirei. E porque eu não curtiria? A voz dela era legal, a instrumentação divertida e no final das contas, música é música né? De MC Loma a Schubert, é tudo barulhinho, batucadinha, acordes, melodias. Private Dancer não é tão diferente de Ilari-lari-ê quanto a gente gosta de acreditar. Existe algo na progressão harmônica de What's Love Got to Do With It que é inerentemente adulta? Acho que não. Claro, dá pra debater se os versos desse disco são apropriados para uma criança (não são muito) mas, no caso, eu não sabia inglês, então foda-se.
Embora eu claramente não seja uma jovem mexicana apaixonada dos anos 1990, recentemente pirei num disco do Luis Miguel, um dos crooners românticos mais famosos de toda a América Latina e alguém que certamente não fazia música para o meu público alvo. O álbum, no caso, se chama Aries, lançado em 1993, vencedor do Grammy de Pop Latino daquele ano, com mais de três milhões de cópias vendidas. Descobri ele por um acaso, quando fui informado que uma das faixas, Que Nível de Mujer, era um cover do Tower of Power, a famosa banda californiana de funk e R&B. Pensei: “Se o Luis Miguel também curte Tower of Power, talvez tenhamos mais em comum do que eu imaginava". Vai saber, por exemplo, se o Luis Miguel também não tem um substack de recomendações? Quién sabe no te gustas?
Fui ouvir o tal do cover e acabei vidrado não só nele mas no resto do disco, composto de músicas animadas e transantes como Suave, além de uma série de power ballads bem típicas da época, com suas belíssimas modulações de tom e interpretações carregadas de emoção. O disco é bem latino, mas com influências das mais variadas, como na música Luz Verde, um new jack swing que poderia estar em um disco do Michael Jackson, numa parada meio Malo, de Miguel Yackson. Enfim, Aries é super bem produzido e o Luis Miguel canta pra caralho. Duas qualidades que pessoas de todas idades, gêneros e origens podem apreciar.
Filme
Acima de Qualquer Suspeita - Alan J. Pakula (1990)
Umas semanas atrás, eu indiquei um filme italiano nessa newsletter chamado Investigação Sobre Um Cidadão Acima De Qualquer Suspeita e comentei que, apesar do filme ser ótimo, eu achava o título muito ruim. Pois bem, dia desses acabei vendo um outro filmão chamado Acima de Qualquer Suspeita e não pude ignorar o fato de que esse título é mil vezes melhor. Embora esse filme também se passe em torno de uma investigação e essa investigação seja sobre um cidadão, o título faz muito bem de não mencionar nada isso. Se é pra dar um nome tão descritivo e convoluto, porque não chamar Titanic de O Barco Que Afundou Por Negligência Do Capitão Matando Centenas De Pessoas e Acabando Com Uma Bonita História De Amor?
Acima de Qualquer Suspeita é um daqueles filmes que eu não sei como eu não tinha visto ainda, dado que ele tem tudo que eu curto. Dirigido pelo Alan J. Pakula, diretor do clássico Todos os Homens do Presidente, o filme faz parte de um subgênero muito específico, mas que eu amo: thrillers dos anos 1990 baseados em best sellers e que contam a história de um cidadão comum colocando sua vida em risco ao enfrentar sozinho uma instituição poderosa e corrupta, seja ela um escritório de advocacia (como em A Firma), uma empresa petrolífera (como em O Dossiê Pelicano) ou, no caso de Acima de Qualquer Suspeita, o sistema judiciário norte americano. Era um tipo de trama que fazia muito sucesso na época, do mesmo modo que as pessoas hoje em dia amam cinebiografias longuíssimas e entediantes, como aquele Oppenheimer, filme tão divertido quanto assistir a um reality show sobre um Tabelião de Notas.
No caso de Acima de Qualquer Suspeita, a história gira em torno de Rusty Sabich (Harrison Ford), um promotor de justiça que é convocado a trabalhar no assassinato de Carolyn Polhemus, sua colega de profissão. Infelizmente, Rusty acaba erroneamente acusado de ser autor do crime, ao descobrirem que ele e a vítima haviam sido amantes no passado. O roteiro tem tantos twists vertigionosos e reviravoltas que eu não sabia se estava vendo um filme ou passeando no Evolution do Playcenter.
Além das ótimas intepretações de Harrison Ford e Bonnie Bedella, que faz sua esposa, o filme também conta com a participação de um dos melhores atores da década de 1990, Raul Julia, que infelizmente morreu cedo demais. O elenco é cheio daquilo que as pessoas chamam de that guys, que são os atores e atrizes que você já viu em vários filmes mas nunca sabe o nome. Tipo esse cara aqui, que me fez pausar o filme e entrar no imdb só pra matar a minha curiosidade.
Enfim, é isso! Até a próxima.
Aprecio sua perseverância em sempre dar um jeito de fazer alguma crítica ao Oppenheimer! =D